Indo por partes
mcr 7/8, Jan,19
O país, algum país, provavelmente apenas uma pequena parte, está comovido, exaltado, indignado ou, simplesmente, excitado. A causa tremenda é conhecida: um pobre diabo, um indivíduo sem a mínima representatividade (política, moral, social) apareceu num programa da manhã a responder a uma questão (também ela) pouco interessante. Tratava-se, ao que li e agora estou farto de ouvir, de saber se Salazar, enfim o seu impertinente fantasma, estava vivo (como o de Stalin nos corações progressistas de uns centos de criaturas “m-l” que ainda hoje rodam por aí dentro de partidos legais ou de frentes partidárias assumidas e com responsabilidades) e se seria necessário o seu regresso. Convenhamos que a pergunta não era do mais inteligente e que denotava falta dolorosa de tema para uma televisão ou para um programa (ou para um mero apresentador).
Todavia, um tal Manuel Machado, assanhado cabeça rapada, foi ao dito programa dado, pelos vistos, ter “opiniões polémicas”. No caso polémico deve significar burro (e não me refiro só ao entrevistado...).
Na questão de polémicas ficou-se por pouco. Regougou umas frases com escasso sentido e pior gramática, afirmou que não era contra os homossexuais nem contra os pretos e deixou no ar – ao que consigo perceber dos relatos confusos mas palavrosos que vão chegando – a ideia de que com uma extrema direita daquele género podemos nós, sem sequer erguer um pé para uma canelada. A coisa foi, e estou a ser generoso, risível. Direi mesmo que convinha repetir o programa duas, dez, vinte vezes para que o público português percebesse que se o perigo é aquilo então poderemos dormir descansados. Um pouco como a prestação da senhora Le Pen frente a Macron: um desastre e uma goleada do actual presidente francês.
Uma segunda constatação, também prévia decorre da personagem entrevistada. A criatura tem antecedentes criminais e não poucos inimigos no meio onde vegeta. Foi condenada e esteve na cadeia largos anos pelo que, nesse domínio, pagou à sociedade as suas malfeitorias. E pagou-as pesadamente, ao contrário de algumas “personalidades” que, volta que não volta, se pavoneiam nas televisões indígenas e que tem nas mãos o sangue inocente de umas quantas “vítimas colaterais”. Não consta que tenham sido julgadas e condenadas e, pelos vistos, aquilo, aquela autoria moral descabelada, parece ter sido um pecado venial, umas dores do parto da democracia, uns pequenos excessos perdoáveis pela opinião pública já esquecida (ou apenas conformada com uma justiça a várias velocidades e com a conveniente amnésia política da nomenkatura).
Portanto, vir agora, relembrar o passado prisional do tal Machado parece-me uma segunda tentativa de condenação por factos já julgados e punidos.
Porém, o pior disto tudo, desta gritaria escandalizada de filisteus é confundir uma burrice televisiva com um golpe de Munique, com uma marcha sobre Roma, com um 28 de Maio, com a “cruzada” do Franco, para já não falar do tropical Jair que arrota postas de pescada num português lamentável diante da impassível e fraterna testemunha que de Portugal lá foi para defender a CPLP, a “amizade” luso-brasileira, os restos de uma colónia de portugueses em terceira geração que, eventualmente, terão aplaudido o capitão “mito” com ambas as mãos.
Hoje os jornais noticiam que mais de trezentas “personalidades” e um quarteirão de pessoas colectivas (de que pouca gente ouviu falar, cuja actividade era até agora desconhecida ou mínima) escreveram uma “carta aberta” que, francamente, também não demonstra que os redactores tenham inventado a pólvora. Nos últimos dias o sindicato dos jornalistas, uma alta autoridade que tutela a imprensa, vários jornalistas e comentadores com tabuleta na última página de um jornal de “referência”, enfim todos, ou quase, ou seja, os do costume, vieram subscrever-se no politicamente correcto em bicos de pés, “também eu, também eu”... Deprimente!
Contra a corrente, só li Pacheco Pereira, honra lhe seja, que marcou com segurança as fronteiras desta nova guerra do alecrim e da manjerona.
Entre os indignados sobressai a baça figura do senhor Ministro da Defesa que num tweet alardeou duas considerações de fraca qualidade e uma imagem de florestas a arder para agradar a incendiários. S.ª Ex.ª ministro da “grande silenciosa” (as forças armadas) deveria ter reflectido cinco minutos andes de se esganiçar contra a estação de televisão onde os factos horrendos se passaram. É que poderia alguém, de má fé, claro!, pensar que na declaração do cidadão que, aliás, é ministro e não dos menores, perpassava a sombra de uma coação. Claro que S.ª Ex.ª nunca, de nenhum modo, sequer em sonhos, quis dar essa penosa impressão. Não quis mas deu.
Do senhor ministro espero com intranquila ansiedade algo sobre a merda de Tancos e sobre os que sabiam do que se tratava. Falo de militares e de civis e dos importantes. Até à data, nada, zero, raspas de raspas... Como se, cada vez mais, o rol de culpados e conhecedores alastrasse qual mancha de azeite e fosse paulatinamente atingindo muita gente acima de toda a suspeita (se é que se lembram de um filme italiano de Elio Petri: “indagine sul un citadino al di sopra di ogni sospetto” (1970, um grande filme político)
S.ª Ex.ª tem o direito de cidadania como é evidente. No entanto, é ministro. E um ministro tem de saber que tudo o que faz ou diz é escrutinado pelos cidadãos, amigos ou adversários, como já ocorreu um par de vezes com outros membros do actual executivo, mormente a senhora Fonseca, ou, antes, o senhor João Soares o “esbofeteador” e aquela senhora ministra da Administração Interna de que já nem o nome recordo. Aos senhores ministros pede-se trabalho, zelo, competência e que despachem as matérias que lhes competem com brevidade e sensatez. Não precisam, como Tartufo, de vir para arena bater três vezes com a mão no peito. A gente sabe que o senhor ministro é democrata, dos quatro costados. Se quiser adversários escolha um à sua altura melhor que um rapazola já entrado em anos, de suástica no braço e poucas ideias na cabecinha sonhadora.
Não quero com isto dizer que me não preocupam os assomos autoritários de governantes seja cá seja no Brasil, na Venezuela, na Guatemala, na Coreia do Norte ou na China. Ou no leste europeu onde perpassa um cavalheiro húngaro que também foi fraternamente abraçar o Bolsonaro. Vivi trinta e três anos da minha vida sob um poder rural, católicão, gangrenado por dentro, incapaz de pensar o mundo exterior e de perceber a sociedade portuguesa. Não me conformei e recusei-me a ser súbdito dessa gente. E lá marchei para cadeias variadas. O melhor da minha vida passou-se nesse universo cinzento, pesado e triste. Apesar de tudo tive sorte, porquanto alguns centos de portugueses tiveram pior estadia nas cadeias e por mais tempo. Talvez a minha juventude me tivesse salvo de horrores piores. Duma coisa estou certo. Esses anos e os primeiros da democracia curaram-me de várias coisas, entre elas do hábito de gritar pelo lobo mesmo se apenas se avista um pobre cão. E de ver o mundo a preto e branco. Dum lado os atentados à liberdade pessoal são monstruosos do outro, simétrico, são louváveis esforços de construir o futuro. Não são. Ponto, parágrafo.
Se, e quando, o autoritarismo anti libertário vier, não terá o Machado como anjo anunciador, podem estar certos. Espero que, nessa altura, os que se apressam a ver a floresta a arder mesmo quando a luz que se avista seja apenas a de um pirilampo à procura de fêmea, se exaltem e se disponham a agir. A agir. A impedir. A dizer, alto e bom som, NÃO.
Até lá, bom ano.
* Na gravura: o ovo da serpente (filme de Ingmar Bergman)
A realidade ultrapassa sempre a mais louca imaginação
mcr. 26.09.18
A detenção de quatro membros da Policia Judiciária Militar, de três elementos da GNR de Loulé (Loulé? A Loulé da tia Anica? ) e de um civil (presumível gatuno das armas e munições roubadas em Tancos) se, por um lado é uma vitória (mais outra...) da Srª Procuradora Geral a quem o Governo e o Sr. Presidente tão secreta quanto eficazmente calçaram os patins, é também indício de que na “tropa” e no Ministério que a tutela anda muita coisa ao Deus dará.
Quanto a este último ponto já nenhuma dúvida subsistia. Toda aquela história mal contada de terem uns paióis menos guardados que a capoeira de um camponês afectado por um Alzheimer do último grau, de intentar processos de inquérito a cinco coronéis, de os “suspenderem” dos respectivos comandos, de um Ministro vir contar histórias da carochinha para a praça pública, chegando ao ponto (inenarrável e, não tenhamos medo das palavras, tolo) de deixar cair aquela pérola do “por absurdo até pode nem ter havido um roubo” , as circunstâncias do “achamento” das coisas roubadas (que até nem eram exactamente as que constavam do rol inicial...), a extraordinária intervenção da GNR de Loulé que dista de Tancos uns bons trezentos quilómetros, o jogo das escondidas entre a PJM e a PJ, tudo isto cheirava mal, fedia que se fartava á distância.
Eu duvido que tenha havido português minimamente atento e são de espírito que não se tivesse espantado com todas estas tropelias. Em Espanha, o jornal “El País” ria-se, por cá quem o lia, tapava a cara de vergonha. Não gosto da expressão “tropa fandanga” mas mesmo esta é piedosa perante o que se passou.
E resta a dúvida. Foram só estes (tirando o gatuno que espavorido resolveu entregar o roubo) os militares que alinharam nesta conspirata, nesta cruzada de dementes, ou há mais gente.
E ninguém se demite? Nem o tal Chefe de Estado Maior que está a caminho de passar à peluda ou o inexistente Ministro que tropeça na via crucis ministerial como um cego de Brueghel? Sª Excelência não se sente ridículo, já que provavelmente não lhe ocorreu ainda envergonhar-se?
“É assim que se faz a história”
“estamos no extremo ocidental de uma europa gangrenada...”*
O título não é meu. Pertence a Eduardo Guerra Carneiro (1942-2004), excelente poeta e meu velhíssimo amigo com quem comecei a privar cerca de 1962. Até ao seu (in)esperado suicídio sempre nos encontramos à volta de uma cerveja, do amor pelos gatos, da poesia e das suas inesgotáveis paixões. EGC vivia em estado de permanente paixão e conheci-lhe uma boa dúzia de musas só pelo ele me confidenciava.
O seu fim de vida não foi bom. Alcoólico (como tantos outros poetas), generoso como poucos, cronista talentoso e jornalista de mão cheia, era senhor de uma notável cultura. Nos anos duros, fora um resistente no sentido mais nobre da palavra. Matou-se atirando-se da janela para a calçada (Jorge Silva Melo, outro amigo comum e talentoso dedicou-lhe uma belíssima crónica: “o poeta que se atirou para as estrelas”. Era bom que se reeditassem as suas obras ou, pelo menos, que se publicasse uma boa antologia dos seus poemas. No mercado alfarrabista, os seus livros são apreciados e muito procurados, o que é sempre um bom sinal.
Fechemos porém este introito literário para nos mergulharmos a contragosto no tema desta crónica: as desventuras da História e os seus causadores.
Anda por aí, na última página do “Público” um cavalheiro que se assume como “historiador” mesmo se, desse ponto de vista, se lhe conheça obra assaz escassa.
A propósito da Europa, melhor dizendo da União Europeia, ei-lo que, num incomparável exercício de lirismo político, entendeu juntar a Schumann, putativo pai desta agremiação um político italiano (Altiero Spinelli) que seria (é ele quem o diz) comunista. Spinelli teria, ainda durante a época mussoliniana, sido exilada para um remoto ponto do país e aí surgiu-lhe a ideia de uma Europa Unida que travasse a lepra fascista.
Não se sabe exactamente como é que isso se conseguiria (ou, reportando-nos à actualidade, se consegue) sobretudo porque no “limes” europeu existia a União Soviética que em brevíssimo tempo haveria de engolir os países bálticos e parte da Polónia, para já não falar no que acontecera a algumas das “repúblicas” unidas (o caso mais exemplar é o da Ucrânia mas algumas das nações do Cáucaso sofreram idêntico destino, ou seja perderam toda e qualquer independência teórica de que na constituição soviética beneficiavam.
Mas a coisa vai ainda mais longe. Se é verdade que Spinelli foi na sua juventude entre os os 17 e oss 30 anos) membro do PCI não menos verdade é que depois de fazer 30 anos começa a afastar-se do Partido (uma camarada afirma nesses anos -1937-1943- que as posições de Altiero são “perigosíssimas dado que põem em causa o estalinismo. E logo em 1937 é expulso do PCI sob a habitual acusação de minar a ideologia bolchevique e de não ser mais do que um pequeno burguês ou até (crime ignominioso) de poder ser um trotskista!!!
Em 1941, quatro anos depois da expulsão escreve o “Manifesto per una Europa libera e unita” que depois circulou com o nome “Manifesto di Ventotene.
Nos anos que seguiram Spinelli torna-se membro do Partito d’Azione e em 1945 participa na primeira conferência Federalista Europeia. Pouco depois funda o Movimento della Democrazia Republicana (posteriormente Concentrazione Democratica Repubblicana) .
Os partidos comunistas combateram asperamente os amigos de Spinelli e jamais admitiram qualquer espécie de unidade europeia, aliás impossível desde a criação da Cortina de Ferro.
A Europa tal qual a conhecemos foi aliás, em grande parte, uma reacção à ideia comunista e ao bloco soviético.
Spinelli viria a ser deputado em Itália e deputado europeu até à sua morte. E se é verdade que nos últimos anos participou como independente nas listas do PCI, não menos verdade é que este operara, em relação à URSS e às “democracias populares” uma reviravolta que, na prática, como aliás depois se confirmou, o afastava velozmente do ideário marxista e de quase todos (senão todos) os postulados do “movimento comunista internacional”. Para qualquer estudioso daquela época, Spinelli era fundamentalmente um membro da “esquerda democrática” situando algures entre Nenni e Panella (ou seja entre um dos mais famosos socialistas italianos e o máximo expoenente do Partido Radical Italiano.
O texto do “nosso” historiador simplifica tudo deixando crer que “um jovem comunista” confinado num ermo lugar italiano escrevera um manifesto favorável a uma europa anti-fascista. Poderia acrescentar “e anti-comunista” mas isso ficou no tinteiro.
Aliás, mesmo hoje, se é verdade que a UE mantém a matriz anti-fascista não menos verdade é que a ideia europeia foi desde o seu primeiro momento uma clara negação de qualquer afinidade com o “socialismo real”. E como tal foi percebida e acusada pelos políticos de Leste, pelos partidos comunistas de Oeste e ainda hoje, por cá, é algo de horrendo para a nossa inteligentsia comunista (e afins). Só Tavares não sabe disto ou, sabendo-o, cala-se e vai disparando as suas escassas munições de pólvora seca sempre anti-fascista (se é que ele sabe o que isso é) e sempre ultra-progressista como ele gostaria de parecer. É assim que a história se vai fazendo...
*Eduardo Guerra Carneiro: in “como quem não quer a coisa” ( ed. &etc, 1978)
“É assim que se faz a história”
“estamos no extremo ocidental de uma europa gangrenada...”*
O título não é meu. Pertence a Eduardo Guerra Carneiro (1942-2004), excelente poeta e meu velhíssimo amigo com quem comecei a privar cerca de 1962. Até ao seu (in)esperado suicídio sempre nos encontramos à volta de uma cerveja, do amor pelos gatos, da poesia e das suas inesgotáveis paixões. EGC vivia em estado de permanente paixão e conheci-lhe uma boa dúzia de musas só pelo ele me confidenciava.
O seu fim de vida não foi bom. Alcoólico (como tantos outros poetas), generoso como poucos, cronista talentoso e jornalista de mão cheia, era senhor de uma notável cultura. Nos anos duros, fora um resistente no sentido mais nobre da palavra. Matou-se atirando-se da janela para a calçada (Jorge Silva Melo, outro amigo comum e talentoso dedicou-lhe uma belíssima crónica: “o poeta que se atirou para as estrelas”. Era bom que se reeditassem as suas obras ou, pelo menos, que se publicasse uma boa antologia dos seus poemas. No mercado alfarrabista, os seus livros são apreciados e muito procurados, o que é sempre um bom sinal.
Fechemos porém este introito literário para nos mergulharmos a contragosto no tema desta crónica: as desventuras da História e os seus causadores.
Anda por aí, na última página do “Público” um cavalheiro que se assume como “historiador” mesmo se, desse ponto de vista, se lhe conheça obra assaz escassa.
A propósito da Europa, melhor dizendo da União Europeia, ei-lo que, num incomparável exercício de lirismo político, entendeu juntar a Schumann, putativo pai desta agremiação, um político italiano (Altiero Spinelli) que seria (é ele quem o diz) comunista na altura em que se manifestou pró-europeu. Spinelli teria, ainda durante a época mussoliniana, sido exilado para um remoto ponto do país e aí surgiu-lhe a ideia de uma Europa Unida que travasse a lepra fascista.
Não se sabe exactamente como é que isso se conseguiria (ou, reportando-nos à actualidade, se consegue) sobretudo porque no “limes” europeu existia a União Soviética que em brevíssimo tempo haveria de engolir os países bálticos e parte da Polónia, para já não falar no que acontecera a algumas das “repúblicas” unidas (o caso mais exemplar é o da Ucrânia mas algumas das nações do Cáucaso sofreram idêntico destino, ou seja perderam toda e qualquer independência teórica de que na constituição soviética beneficiavam.
Mas a coisa vai ainda mais longe. Se é verdade que Spinelli foi na sua juventude (aos 17 anos) membro do PCI não menos verdade é que anos depois começa a afastar-se do Partido. Uma camarada afirma nesses anos (1937-1943) que as posições de Altiero são “perigosíssimas dado que põem em causa o estalinismo. E logo em 1937 é expulso do PCI sob a habitual acusação de minar a ideologia bolchevique e de não ser mais do que um pequeno burguês ou até (crime ignominioso) de poder ser um trotskista!!!
Em 1941, quatro anos depois da expulsão escreve o “Manifesto per una Europa libera e unita” que depois circulou com o nome “Manifesto di Ventotene.
Nos anos que seguiram Spinelli torna-se membro do Partito d’Azione e em 1945 participa na primeira conferência Federalista Europeia. Pouco depois funda o Movimento della Democrazia Republicana (posteriormente Concentrazione Democratica Repubblicana) .
Os partidos comunistas combateram asperamente os amigos de Spinelli e jamais admitiram qualquer espécie de unidade europeia, aliás impossível desde a criação da Cortina de Ferro.
A Europa tal qual a conhecemos foi aliás, em grande parte, uma reacção à ideia comunista e ao bloco soviético. Bastacompulsar as acusações que nesse tempo vieram a público todas saídas do bloco soviético ou dos partdos sob influência soviética.
Spinelli viria a ser deputado em Itália e deputado europeu até à sua morte. E se é verdade que nos últimos anos participou como independente nas listas do PCI, não menos verdade é que este (PCI) operara, em relação à URSS e às “democracias populares” uma reviravolta que, na prática, como aliás depois se confirmou, o afastava velozmente do ideário marxista e de quase todos (senão todos) os postulados do “movimento comunista internacional”. Para qualquer estudioso daquela época, Spinelli era fundamentalmente um membro da “esquerda democrática” situando algures entre Nenni e Panella (ou seja entre um dos mais famosos socialistas italianos e o máximo expoenente do Partido Radical Italiano.
O texto do “nosso” historiador simplifica tudo deixando crer que “um jovem comunista” confinado num ermo lugar italiano escrevera um manifesto favorável a uma europa anti-fascista. Poderia acrescentar “e anti-comunista” mas isso ficou no tinteiro.
Aliás, mesmo hoje, se é verdade que a UE mantém a matriz anti-fascista não menos verdade é que a ideia europeia foi desde o seu primeiro momento uma clara negação de qualquer afinidade com o “socialismo real”. E como tal foi percebida e acusada pelos políticos de Leste, pelos partidos comunistas de Oeste e ainda hoje, por cá, é algo de horrendo para a nossa inteligentsia comunista (e afins). Só Tavares não sabe disto ou, sabendo-o, cala-se e vai disparando as suas escassas munições de pólvora seca sempre anti-fascista (se é que ele sabe o que isso é) e sempre ultra-progressista como ele gostaria de parecer. É assim que a história se vai fazendo...
*Eduardo Guerra Carneiro: in “como quem não quer a coisa” ( ed. &etc, 1978)
Ao que se chegou
Num projecto de livro de Fisico-químicas um anormal que ultrapassa definitivamente o grau máximo de imbecilidade possível resolveu propor um problema em que uma criatura agarra num gato e o atira de uma altura dez vezes superior ao do bichano.
Que em 2015, se convide alguém com estes dotes morais e esta misericórdia felina já diz muito do que este país pode vir a ser: uma merda triste que tenta desesperadamente igualar-se a outras podridões estilo Exército Islâmico.
Já sei que me vão acusar de desproporcionalidade entre a tortura de um gato indefeso que há milénios acompanha o homem e a cabronagem assassina e infecta que mata tudo o que se mexe e não recite todas as suratas do Corão. Todavia, lamento informar que a aberração moral é exactamente igual e a pulsão homicida idem.
A besta que pensa um exercício com gatos a serem atirados ainda não matou um humano por simples pavor do castigo. É apenas, além de inqualificavelmente estúpido e mau, um cobarde.
Espera-se desanimadamente que os editores do livro não mais peçam ao mata-gatos qualquer livro, qualquer trabalho, qualquer conselho já que não há seguramente hipótese de vir a conhecer o nome da miserável criatura.
RIP
Descansa em paz!, ou “requiescat in pace, como diziam os nossos longínquos avós. Como se a vida fosse e, de facto é, uma árdua tarefa, um esforço inglório e sem fim. Há um provérbio bantu que assevera que, quando nasce, o homem só tem uma certeza: morrerá. Não é pessimismo mas apenas uma maneira de dizer que esse homem que atravessará a vida protegido pelos seus antepassados, antepassado será de outros e protege-los-á pela eternidade fora.
Tudo isto vem a propósito do Iduíno (assim mesmo!) Lopes que finalmente morreu depois de quase três anos de como devido a um avc manhoso que o terá prostrado no início de uma medonha madrugada.
Iduíno Lopes, um funcionário ignorante não aceitou que o pai emigrado nas Américas chamasse ao pimpolho Edwin. Ninguém se lembrou que há o portuguesíssimo Eduíno (e até já vi Heduíno) pelo que o funcionário burro e nacionalista grafou com I e já está. Convém dizer que o Iduíno se estava nas tintas, tanto lhe fazia, até era original...
Trazido para Portugal muito pequeno, o Iduíno foi obrigado a permanecer cá devido à guerra que entretanto rebentara. Estudou e formou-se em Coimbra em Medicina depois de uma pequena tentativa de cursar Letras ao lado do Zeca Afonso de quem era amigo e colega.
Uma vez obtido o canudo, desandou para os Estados Unidos onde tinha quase toda a família. Portugal, o Portugal do fim dos anos cinquenta, pesava-lhe toneladas sobretudo porque o Iduíno era democrata e da “oposicrática” como se dizia.
Uma vez em Boston começou a trabalhar na área da psiquiatria hospitalar. Apanhou com centenas de veteranos da Coreia e vinham daí os seus vastos conhecimentos do stress de guerra. Ao mesmo tempo começou a trabalhar com heroinómanos e fez parte da primeira geração de médicos que se socorreu da metadona.
Nos EUA, fazia parte dos círculos que se opunham ao regime português e foi por isso que quando Soares foi à América falar da política do PS para Portugal que ele esteve com aquele como anfitrião e intérprete não oficial. A tal respeito contava história deliciosas: como Soares não dizia uma palavra de inglês, um dos seus acompanhantes que dominava a língua “suavizava” as declarações do líder socialistas tornando-as aceitáveis para as plateias americanas pouco dadas a esquerdismos desnecessários (como logo a seguir se viu, quando o “socialismo foi metido na gaveta” nos governos soaristas. E no programa do partido, claro.) Um êxito tremendo. Afinal era bom soares não percber patavina de inglês.
Uma vez Portugal em democracia, eis que o Iduíno e a Mimi entendem regressar à pátria. Meu dito e meu feito. Fizeram as malas, as contas com os hospitais em que trabalhavam os dois (a Mimi era uma extraordinária antemo-patologista) e, com os filhos, ala que se faz tarde. Aterraram no Porto, não sei se por acaso ou por escolha pensada. A verdade é que chegaram aqui ao bairro e rapidamente se deram a conhecer. Ou melhor: foi o Iduíno quem fez a despesa da festa. O raio do homem falava alto, demasiado alto e falava muito. Em pouco tempo toda a gente o conhecia. Porque era alegre, bom profissional (já lá iremos) e adorava conversar.
Chegava ao café onde ambos líamos os jornais e sentava-se numa mesa perto. Eu fingia que nem o ouvia mas, um dia, a Maria José Pacheco sussurrou-lhe que eu me formara em Coimbra. Tanto bastou para o Iduíno que era “coimbrinha” até ao sabugo, me começar a falar. Eu bem protestava que não era da Académica (e não sou) que não vertia a mínima lágrima ao ouvir as baladas coimbrãs (e não verto) que achava a Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra uma chatice, a praxe uma aberração mas nada disso comovia o meu amigo. Para ele o vírus coimbrão era eterno e pacífico e ninguém lhe era imune.
Quando soube que eu tinha sido condiscípulo de um dos cunhados e contemporâneo de um outro, foi o fim. Começamos a descobrir dezenas de amigos comuns, a começar pelo Zeca e a acabar no Manel Alegre e no Adriano.
Depois o Iduíno fundara e dirigia o CAT onde pioneiramente introduziu (contra muita e feroz opinião) o tratamento de drogados com recurso à metadona. Um escândalo no país dos brandos costumes!
Quando me reformei passamos a ser companheiros diários de mesa nesta esplanada em que agora escrevo à sombra da sua permanente alegria, do seu vozeirão, das suas reiteradas e apaixonadas defesas das nacionalidades espanholas, da esquerda a todo o custo. O Iduíno era fidelissimamente ps mesmo quando a evidência lhe exigia mais moderação. Com uma ténue excepção: não dizia sim a tudo o que borbotava de Sócrates mesmo se continuasse a votar no PS. Não teve tempo para conhecer bem este actual governo pois há cerca de dois anos e meio foi alvo de um avc. Em coma desde então só a amizade antiquíssima da Maria José e o amor de um dos filhos (precisamente o que dos três não era médico) é que apoiavam a ideia de uma recuperação. Não o fui ver nunca. Não suportava a ideia de um Iduíno prostrado numa cama sem fala, sem um olhar, sem um gesto. Preferi, quiçá egoisticamente, manter a recordação de um sanguíneo bem disposto a que nem uma calvície forte fazia parecer octogenário.
Morreu no sábado passado. Deixa filhos, amigos inconsoláveis, uma obra e apodo de dr Heroíno dado por doentes que ele tentou abnegadamente salvar ou pelo menos tornar menos infelizes.
Olho o jardim que tantas vezes, centenas de vezes, comtemplámos e penso nele como um antepassado benéfico que nos protegerá doravante. Poucos se podem gabar de tanto.
Descansa em paz, velho amigo. E que as tuas cinzas repartidas entre a terra de uma aldeia da Beira baixa e de um campo da Nova Inglaterra façam frutificar ervas e árvores, espigas e frutos, Iduíno, homem bom e homem de bem.
* na gravura: figura de ntepassado /etnia Luba).
Les lendemains qui (dé)chantent
“…ceux qui crèvent d'ennui le dimanche après-midi parce qu'ils voient venir le lundi et le mardi, et le mercredi, et le jeudi, et le vendredi, et le samedi et le dimanche après-midi.”
Os “amanhãs que cantam” (no caso vertente que “desencantam”) fazem (ou faziam) parte de um folclore da esquerda europeia do meu tempo de jovem ingénuo, combativo e esperançado.
Estávamos na política por reacção ao sufoco salazarista, à pobreza imperante e circundante e tendo como pano de fundo a história recente e os seus imensos desastres. E pela liberdade, obviamente.
Acreditávamos piamente que, apesar de tudo (e neste tudo estava mesmo tudo desde o gulag aos processos de Moscovo, desde as liberdades suspensas até que o capitalismo deixasse de cercar a “pátria dos trabalhadores”, desde o pensamento único até à fidelidade já ligeiramente em queda ao “pai dos povos”, de resto prontamente substituído em desordem por Mao Zedong, Fidel de Castro, Ho Chi Minh, ou mesmo Enver Hoxha para os menos exigentes) chegariam os dias felizes, a festa dos povos, a igualdade, a liberdade e a vida tranquila.
Nada disso aconteceu como se sabe. Hoje já ninguém se lembra de Stalin, menos ainda de Mao para já não falar dos outros absolutamente menores. Fidel vagueia de pijama ou fato de treino por uma Cuba que se prepara para receber uma embaixada americana, dólares, carros novos e investimentos por parte dos habituais bons samaritanos de Wall Street.
Mas deixemos este cortejo de espectros que não assustam ninguém e muito menos a Europa e vamos ao que interessa: as eleições gregas.
Para quem tem alguma memória, digamos dos últimos 15 anos (nem é preciso descer ao século passado) e relembre o leque partidário grego de então (o PASOK a cerca de 50% dos votos, a Direita a disputar com mais alguns partidos (entre eles duas formações comunistas, uma do “interior” outra sei lá donde) os restos da votação, a surpresa de ontem domingo há de ser grande.
Para onde foi a formação do clã Papandreu que há mais de um século mandava e desmandava na Grécia?
Os resultados de ontem põem este antigo símbolo da esquerda socialista (o PASOK afirmava-se muito à esquerda dos seus parceiros europeus) no sétimo lugar, o último creio, da votação: menos de 5%!!!
Claro que o PASOK carregava penosamente com as principais culpas (mas não todas, que a Direita, mesmo fora do poder, também colaborara no descalabro) da actual situação grega.
É mais que provável que uma grande maioria dos seus antigos votantes se tenha transferido de armas e bagagens para o compósito Siriza, enquanto uma pequena percentagem terá ido para um agrupamento dissidente. E o PASOK ficou com o último quadrado de fidelíssimos, eventualmente de socialistas de toda a vida.
E a Nova Democracia, agora apeada do poder? A ala mais radical terá engrossado os Gregos Independentes bem como o novo terceiro partido, o sinistro Aurora Dourada que, mesmo com os dirigentes na cadeia, consegue mais de 6% dos votos. Conviria lembrar, para os mais esquecidos, que também na Alemanha, em tempos que já lá vão um partido radical começou a sua caminhada depois do seu futuro líder ter feito a experiência do cárcere.
Os comentadores, como é hábito, extasiam-se com esta performance mesmo se desde há muito tempo, a bem dizer desde as últimas eleições fosse provável este desenlace.
Os mais ousados apostam no “fim da austeridade” o que não deve querer dizer grande coisa porquanto mesmo com grandes cedências ( o que não parece assim tão evidente) da ”Europa” as coisas demorarão muito, mas muito, tempo a compor-se.
O colunista Rui Tavares (Público), actual dirigente do “Livre” compõe mesmo uma “ode triunfal” e jura a pés juntos que nada ficará na mesma. Na Grécia, na Europa, e, num suspiro arrebatado, em Portugal. Neste último caso, não se vê bem em que apoia tão atrevida mensagem.
“para que as coisas permaneçam na mesma é preciso que tudo mude”
Desconheço se Tavares leu “O Leopardo” ou se, pelo menos, viu o belíssimo filme de Visconti. E se, tendo-o visto, recorda esta frase cínica de um dos personagens que propõe ao Tio, o Príncipe de Salina, uma reorientação dos apoios políticos para que a família possa conservar todas as mordomias de que gozava.
Não ponho os dirigentes do Siriza na posição da velha aristocracia siciliana (entretanto substituída pela corrupta rede clientelar dos novos donos da Itália com o entusiástico apoio da honorata societá que medrou como nunca e se exportou para toda a península e depois para o mundo) mas tenho a fortíssima impressão que do programa “radical” do Siriza muito lastro já se perdeu.
A começar pelo “euro”, antes, há meses apenas, tão detestado e agora renascido das cinzas qual nova fénix esperançosa. E a continuar por certas promessas que seguramente não serão exequíveis nos tempos mais próximos. Refiro-me à fixação do salário mínimo nos setecentos euros (entre nós, numa situação absolutamente melhor, conseguiu-se atingir o patamar dos 500 euros) ou à miraculosa criação de postos de trabalho para o gigantesco número de desempregados existente.
Tsipras defende que as previstas despesas serão financiadas pelo crescimento económico (?) e pela luta contra a corrupção (e já agora, digo eu, pelo estabelecimento do cadastro coisa que na Grécia nunca existiu!). Portanto o Governo ou o Estado não entram com um cêntimo ou quase. O pequeno problema que se levanta é que na Europa o que reina é uma morosa deflação que a Grécia mesmo com um crescimento de 2,9% este ano (e um absoluto desastre no que toca a receitas fiscais em atraso...) não chega lá tão depressa. Por outro lado, a luta contra a corrupção, endémica no país, desde praticamente a Independência, durará um par de décadas.
É verdade que Tsipras prometeu falar duramente com os parceiros europeus. Acredito piamente que ele acredita nisso.
E também é verdade que os juros da dívida grega estavam à altura da péssima reputação do país. Mas também é verdade que já houve uma renegociação da dívida grega que a reduziu a metade.
Pessoalmente, mas eu não passo de um português assolado pelos impostos, sem economias (quase todas comidas ao longo do tempo por uma biblioteca de 21.000 volumes), creio mais na dilação dos prazos de pagamento do que no perdão. Aliás essa é igualmente a minha receita para Portugal. Pagar um balúrdio em tão curto espaço de tempo, favor que devemos a quem negociou com a troika (não o esqueçamos) era uma impossibilidade na altura e é uma impossibilidade hoje.
Todavia, é difícil usar uma linguagem de força quando se precisa desesperadamente de uns milhares de milhões de euros num futuro dramaticamente próximo. E quando, para lá da Frau Merkel, aparecem os negociadores holandeses ou finlandeses muito menos propensos ainda a aceitar acordos “demasiado generosos” a seus olhos.
Não há pior cego...
A reacção mais alarmante à vitória do Siriza vi-a nas declarações do senhor Melenchon, líder de uma diminuta “frente de esquerda” em França. Escuso de recordar o paupérrimo resultado da criatura nas últimas eleições. Basta-me, referir (com imensa amargura, devo dizê-lo) que o fenómeno populista francês paralelo ao Siriza e pescando nas mesmas exactas regiões que outrora davam o voto e a força ao PCF e ao PS e são agora zonas de influência e implantação do “Front National”, é o da senhora Le Pen que se apresenta cada vez mais como uma forte candidata presidencial.
Melenchon com a mesmíssima cegueira dos dirigentes do KPD alemão na década de trinta, assesta a sua artilharia no PS de Hollande usando uma linguagem que, mutatis mutantis, não é assim tão diferente da suicidária mensagem dos comunistas alemães, defensores da aberrante teoria “Klasse gegen Klasse”. É bom lembrar que Hitler só ganhou graças à luta fraticida na Esquerda mesmo se já desfrutasse do apoio de enormes massas de proletários e muita classe média reduzidos à miséria pelos efeitos combinados da guerra, do Tratado de Versalhes e da crise económica mundial. A História como dizia o das barbas repete-se (e sempre para pior!).
É bem verdade que Hollande (esperança frustrada de Seguro mas não só) deu no que deu. E mesmo que o caso “Charlie” o tenha momentaneamente salvo triplicando ou quadruplicando o desastroso índice de popularidade com que terminara 2014, a verdade é que governa um PS fragilizado, por uma minoria rebelde. Provavelmente não chega para bater a Direita “civilizada” e/ou a outra que, como alguém afirmava, faz o diagnóstico certo e recomenda os remédios errados.
O outro foco de esperança de Tavares, Melenchon e outros, é “Podemos”, mais um fortíssimo movimento populista também ele nascido da crise. E, mais uma vez, na sua origem está a desilusão com o PSOE de Zapatero e a governação violenta do PP. À medida que se vai aproximando o momento eleitoral, também “Podemos” vai enterrando alguns dos seus mais audaciosos projectão, nomeadamente o extraordinário “salário mínimo garantido para todos os cidadãos”.
O que mais surpreende é a ilusão repetida no bondade dos movimentos estrangeiros. Curiosamente, seja em Portugal, seja na França, aquilo que se resolveu apelidar “esquerda radical”, tem uma presença insignificante nos centros de poder e nada, até ao momento, fundamenta o prognóstico de cá ou lá poderem surgir émulos do Siriza que de 2009 a 2015 multiplica a votação por seis.
Também valeria a pena recordar para os mais distraídos que o sistema eleitoral grego premeia exageradamente o partido que chega em primeiro lugar. Num sistema proporcional os deputados do Siriza pouco ultrapassariam a centena de lugares. Ou seja: uma coisa é a votação, outra a população eleitora (que no caso em apreço se cifrou em 60% do eleitorado.
E isso já parece reconhecido pelo Siriza: depois de se poder pensar que se aliariam ao To Potami ou até ao PASOK, tudo indica que será com os “gregos Independentes” que fará Governo. Ou seja com um partido claramente de Direita, anti-troika e anti emigrantes. Convenhamos que para primeiro dia é já muita areia para a camioneta dos admiradores do radical Siriza.
Não vou ao ponto de dizer que entre os melhores espíritos há afinidades mas aí está esta espúria aliança para fazer prever que os próximos dias vão ser muito instrutivos. E pouco entusiasmantes.
Desculpem lá mas só Rouault foi capaz (e numa água forte que ilustra este texto) de proclamar “demain sera beau (disait le naufragé)” nesse belíssimo conjunto que se chama “Miserere” (1948). Mas Rouault era apenas um dos grandes pintores da metade do século passado e a sua mensagem vinha tintada de cristianismo social e não se destinava a governar o mundo, a Europa ou apenas a Grécia que nos educou noutro culto bem mais laico.
* Os amanhãs que (desen)cantam
** os que, no domingo à tarde, morrem de tédio porque vêm chegar a segunda feira, a terça, a quarta, a quinta, a sexta, o sábado e o domingo à tarde (Prevert, Paroles, há tradução portuguesa recente)
***Classe contra classe, palavra de ordem suicidária do partido comunista alemão (apoiado pelo Komintern) justificando a luta contra os "social traidores" do SPD
**** Há tradução portuguesa de "O leopardo" de Lampedusa ehá igualmente edição legendada do filme homónimo de Visconti.
. Estes dias que correm, 32...